O dia de um professor
(daqueles que tiveram a sorte de ser colocados)
8:02h - Ouvir a TSF. Verificar se a Ministra já se demitiu. E já agora o Paulo Bento. Ficar triste. Ouvir a crónica do Bruno Nogueira para animar.
8:30h – Chegar à escola.
8:30h – Chegar à escola.
8:40h – Dar a 1ª aula.
8:52h – Ser ameaçado de pancada. Tentar intimidar os putos sugerindo que vai fazer queixa aos amigos. Tentar que não percebam que os amigos estão a mais de 300 kilómetros.
8:54 – Pedir silêncio e ser insultado.
9:02 – Ser agredido. Alguma satisfação por quase ter conseguido acabar a aula antes do tecto arder.
9:07 – Ir ao posto médico da escola receber tratamento. Esperar pela vez atrás dos outros professores.
10:50h – Ser atendido e reencaminhado para o hospital para fazer uma radiografia.
11:15h - Chegada. Verificar que as urgências fecharam. Ser transferido para outro hospital. Fazer o penso, tirar as medidas à médica e voltar à escola.
11:30h – Intervalo grande. Conversar com os colegas sobre assuntos da classe como pensos, Betadine, kilómetros e manifestações.
12:00 – Ultima aula da manhã. Pôr os putos a fazer uma redacção e ir à casa de banho mandar sms's a promover uma manifestação.
12:50h - Enviar sms’s a convocar uma manifestação antes da manifestação. Evitar a pergunta "porquê?".
13:10h – Almoço. Tratar mal a empregada só porque ela se chama Maria de Lurdes. Convidá-la para a manifestação.
14:20h – Visitar colegas no hospital. Informá-los da manifestação. Não esquecer a manifestação antes da manifestação.
14:32h – Magoar os colegas que se recusem a ir nas lesões em carne viva. Desligar a máquina a um doente terminal só porque ele se chama Rodrigues.
15:10h – Sair do hospital. Tratar mal a auxiliar só porque ela é baixinha, usa óculos e cabelo armado com laca.
16: 00 – Voltar à escola. Ser confrontado com um GNR que foi verificar se comparecerá nas manifestações e uma mãe indignada com a falta disciplinar atribuída ao seu inocente petiz apenas porque incendiou a sala de aula.
16:20h – Evitar o GNR e ser agredido pelos familiares e vizinhos do puto.
15:10h – Sair do hospital. Tratar mal a auxiliar só porque ela é baixinha, usa óculos e cabelo armado com laca.
16: 00 – Voltar à escola. Ser confrontado com um GNR que foi verificar se comparecerá nas manifestações e uma mãe indignada com a falta disciplinar atribuída ao seu inocente petiz apenas porque incendiou a sala de aula.
16:20h – Evitar o GNR e ser agredido pelos familiares e vizinhos do puto.
16: 50h – Voltar ao hospital. Meter conversa com a médica. Aproveitar o facto de tambem ela estar colocada a 300kms de casa. Dar-lhe um abracinho e afagar-lhe o cabelo. Eventualmente fazer amor com a médica. Ou com a enfermeira. Ou com as duas.
18:10h – Entrar no carro. Chorar com saudades da família que está longe. Tentativa de car-jacking. Carro com pouca gasolina. Ladrões desistem por compaixão. Também já foram professores. Estão sem colocação.
19:00 h – Chegar a casa. Ver o “Preço Certo em euros” e achar piada ao Fernando Mendes. Ficar deprimido.
19:30h – Ver a Ministra na antevisão do Telejornal. Ter um ataque. Tomar o ultimo Xanax da caixa e 2 Lexotan.
19:45 – Ver fotografias antigas e recordar os bons tempos em que fazia o curso e trabalhava em part-time como caixa no Pingo Doce. Deixar cair uma lágrima. Enviar sms à médica a agradecer os préstimos. E à enfermeira.
20h – Jantar uma feijoada leve acompanhada de Tinto "Casal da Serra" de pacote.
20:35h – Ouvir a Ministra no telejornal. Novo ataque. Tomar o resto da caixa de Lexotan. Cartão e bula incluídos.
21:00h – Corrigir testes e, aproveitando o marcador vermelho, fazer cartazes para a manifestação.
22:15 – Reflectir na proposta do Governo sobre a Avaliação dos Professores. Deter-se na palavra “Avaliação” e, pelo sim pelo não, dar de 16 para cima. Chorar.
23:00 – Rezar.
23:01 – Amaldiçoar a Ministra.
23:45h – Receber mms com um vídeo caseiro da médica. Na casa da enfermeira. Com a presidente da Associação de Pais. E um cavalo.
23:57h - Leitinho quente e cama.